sábado, 10 de setembro de 2011

Pagamento em Chumbo



O lugar era sujo e fedorento como uma toca de ratos. Passei a porta dupla e escorei-me numa viga, logo à entrada, e comecei a enrolar um cigarro. Havia cinco homens no pequeno saloon — três jogavam pôquer numa mesa no centro; um bêbado, mais ao fundo, empenhado em encontrar o fundo de uma garrafa; e o barman, atrás do balcão, tentando inutilmente tirar a gordura acumulada em alguns copos —, todos em completo silêncio.
Acendi o cigarro e fui até o balcão, minhas botas embarradas sujando ainda mais o piso imundo.
— Uísque — disse ao barman.
O homenzinho baixo, de cabelos oleosos, serviu um copo e deixou a garrafa sobre o balcão.
— Maldita chuva, heim? — perguntou.
— É.
— Vem de onde, forasteiro?
— De um lugar onde não fazem perguntas.
Peguei a garrafa e me dirigi a uma mesa do fundo.
Passou-se algum tempo, onde o silêncio só era quebrado pelas apostas ditas em voz baixa no jogo de cartas e pelo barulho da chuva, que o telhado daquele barraco fazia parecer mais forte do que realmente era.
Repentinamente um homem escancarou a porta e entrou com passadas apressadas, decididas. Tinha os olhos injetados de raiva, e uma pesada espingarda de cano duplo que colaborava em seu aspecto sombrio.
— Quem é o dono do garanhão malhado para ali fora?! — berrou.
— O mustang é meu — respondi tranquilamente da minha cadeira.
— O que está acontecendo, Stanton? — interrompeu o barman.
— Esse filho da puta matou meu irmão! — continuou o homem grisalho, ainda gritando. — Seu corpo está atravessado na sela do cavalo.
— A cabeça do seu irmão vale alguns dólares em Nogales, por isso o matei. — expliquei enquanto servia mais uísque. — A sua não vale nada, então o aconselho a me deixar em paz se tem amor à pele.
— Guarde seus conselhos e saque sua arma!
Comecei a beber tranquilamente a dose que eu acabara de servir. Isso deixou Stanton nervoso, sem saber direito como agir. Sua atenção estava em minha mão direita, que segurava o copo, o que foi seu primeiro erro. Enquanto eu bebia, minha outra mão estava a poucos centímetros de um dos meus colts. Homens que carregam coldres duplos não são difíceis de encontrar, mas os que atiram tão bem de esquerda quanto de direita são muito raros. De onde estava, meu adversário não tinha visão da minha arma, o que o deixava em desvantagem, por isso esperei que tomasse a iniciativa. Levei novamente o copo à boca, e ele aproveitou o momento para erguer sua espingarda. Foi seu segundo erro.
Saquei o colt com a mão esquerda e atirei. A bala explodiu no peito do homem antes que pudesse puxar o gatilho. Ele soltou um grunhido surdo e dobrou-se sobre os joelhos, sua espingarda caiu de lado seguida por seu corpo. Estava morto.
Levantei e me dirigi à saída. Joguei um dólar de prata sobre o balcão e disse ao barman:
— Se aparecerem mais parentes querendo vingança, diga que podem me encontrar em Nogales. Meu nome é Vince Logan.

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Cheguei à Nogales dois dias depois. Chovera por quase todo o percurso, o que foi bom, pois se o habitual sol causticante da região tivesse me acompanhado, o cadáver de Morgan Stanton estaria fedendo mais do que já estava.
Entreguei o corpo ao xerife e recebi a recompensa. Já estava de saída do escritório do homem da lei, quando um cowboy chegou a galope.
— Xerife! Xerife!
— Diga homem, o que houve?
— Sou vaqueiro do Duplo D, nosso rancho acabou de ser atacado pela quadrilha de Bud Miller. Além de três homens, a mulher do Senhor Dagget foi morta no tiroteio. 
— Tem certeza que era Bud Miller? — perguntei antes que o xerife tivesse tempo de dizer algo.
— Sim. Eu o vi uma vez em Albuquerque, e o reconheci apesar do lenço que cobria seu rosto. Também escutei um dos seus homens o chamando pelo nome.
Deixei o homem dando mais explicações ao xerife, montei no meu cavalo e parti. O rancho Duplo D ficava a doze quilômetros ao norte da cidade. Seria uma cavalgada rápida apesar de o meu cavalo estar exausto.
Há tempos Bud Miller era procurado pela justiça. Ele cometera todo o tipo de crimes, mas por ter assassinado um juiz em Laredo uns anos atrás sua cabeça valia cinco mil dólares. O cartaz de recompensa com sua cara feia estampada estava esquecido no fundo da minha bolsa de sela em meio a tantos outros, mas agora que eu tinha uma pista quente para seguir não perderia tempo.
Cheguei ao rancho e peguei informações com alguns homens. Os bandidos eram sete, e tinham partido para oeste.
— Você vai sozinho atrás deles? — perguntou Dan Dageet, dono do rancho.
— Vou acompanhado de doze soldadinhos de chumbo calibre 45 — respondi pondo a mão nos meus colts.
— Acrescento mais dois mil na recompensa se me trouxer o bastardo vivo.
— Pode separar o dinheiro — eu disse, e parti.

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A chuva cessara por completo, mas o sol ainda estava escondido atrás das nuvens. As pegadas recentes eram fáceis de seguir, porque o terreno estava úmido. Notei que um dos cavalos estava manco e outro tinha uma ferradura com a ponta quebrada. A sorte estava ao meu favor. Com aquelas particularidades nos rastros, seria praticamente impossível confundi-los com algum outro grupo de número semelhante que eventualmente estivesse na mesma trilha.
Segui devagar, fazendo paradas regulares para dar descanso ao meu mustang, que já começara a reclamar por umas férias.
Ao anoitecer acampei para dormir um pouco. Na escuridão eu correria o risco de perder a pista ou acabar caindo numa emboscada sem perceber. Não fiz fogueira, pois não sabia exatamente a que distância eles estavam e não queria ariscar ser descoberto. Mastiguei um pouco de carne seca sonhando com um bom bife. Tive inveja do cavalo, pois o pasto era abundante e ele estava mais bem servido do que eu.
Ao amanhecer o sol nasceu forte. Meu velho mustang estava bem descansado então eu poderia avançar com rapidez.
Passava um pouco do meio dia quando notei, pelos rastros, que os homens haviam se dividido. Três deles atravessaram um pequeno afluente do rio Colorado e seguiram para o norte; os outros quatro continuaram para oeste. Também continuei seguindo a trilha que ia para oeste, por dois motivos: um deles montava o cavalo da ferradura quebrada, que era o rastro mais fácil de seguir; e sendo o grupo maior, a probabilidade do chefe do bando estar com eles também era maior.
 Já entardecia quando os rastros terminaram num pequeno povoado fantasma. Eu já passara por lugares assim outras vezes: eram cidades construídas de uma hora pra outra, próximas a uma mina de ouro ou prata recém descoberta, mas eram abandonadas assim que o minério se esvaísse por completo. O que restava desta era um amontoado de construções caindo aos pedaços, habitado por cascavéis e escorpiões.
À entrada do povoado uma placa dizendo “Bem Vindo a Benson City” jazia crivada de balas.
Num barraco à esquerda, um velho de cabelos e barba brancos pregava alguns caixões. Bem, se havia um coveiro construindo caixões também existiam futuros inquilinos para habitá-los.
— Um e oitenta e nove, acertei? — ele disse, mostrando um sorriso banguela por baixo da barba cerrada. — Eu nuca erro.
— Seus olhos ainda funcionam bem, velho, mas poupe o trabalho fazendo um caixão pra mim. — Acendi um cigarro. — Quatro homens chegaram recentemente... Onde estão?
— No saloon, logo ali na frente. Vai ter confusão, não é?
Ignorei-o e fui até o lugar onde ele indicou. Deixei o mustang do outro lado da rua, junto com os cavalos deles, e caminhei até o saloon.
O lugar fedia a uísque e a mijo velho. Os quatro homens bebiam numa das poucas mesas inteiras do lugar. Um deles contava sobre uma prostituta perneta que conhecera em Tombstone e os outros gargalhavam. Fingiam não se importar nenhum pouco com a minha presença. Bud Miller não estava entre eles.  
O barman tinha uma cara de rato cortada por uma cicatriz que ia da bochecha ao olho esquerdo.
— Cerveja.
Ele ficou imóvel, como se não tivesse escutado. Joguei uma moeda sobre o balcão e repeti:
— Cerveja.
— Não tem cerveja — cuspiu, indiferente.
Havia um pequeno barril sobre o balcão e um pouco de espuma pingava pela torneirinha que dispersava o líquido.
— E o que é isso aí? — apontei para o barril.
— Você não ouviu ele dizer que não tem cerveja ou por acaso é surdo? — interrompeu um dos homens, o que contava a história.
Voltei-me em sua direção, ficando de costas para o barman.
— Se espera reencontrar sua puta de uma perna só qualquer dia desses, é melhor não se meter — avisei.
Fiquei esperando que ele reagisse puxando a arma ou rebatesse com um xingamento, mas nada aconteceu. Fiquei o encarando e vi que seus olhos brilharam como um gato que está prestes a abocanhar um rato gordo. Para minha sorte, havia os restos de um velho espelho no lado oposto de onde estávamos, e notei pelo reflexo que o barman puxava um rifle de baixo do balcão.
Me virei sacando o colt num gesto que eles não puderam acompanhar e meti uma bala no meio daquela cara de roedor. O sangue espirrou nas garrafas da prateleira atrás dele.
Não esperei para ver o que acontecia. Saltei por cima do balcão ao mesmo tempo em que uma chuva de balas passou zunindo em meus ouvidos. Fiquei agachado enquanto cacos de vidro misturados a uísque barato caíam sobre mim. Espiei pelo canto de baixo do balcão, no lado direito. Três deles se protegeram atrás de uma mesa virada, e um deles vinha em minha direção. Se ele estava cansado de viver, resolvi ajudá-lo: levantei e, batendo com a palma da mão esquerda no cão da arma, efetuei dois disparos, que explodiram no peito do homem, fazendo-o tombar para trás, já sem vida. Mandaram bala sobre mim outra vez, mas eu já havia me escondido. Fizeram uma pequena pausa para recarregar e eu aproveitei. Me ergui com um colt em cada mão e despejei chumbo sobre eles. Um dos homens botou a cabeça pra fora para tentar revidar, e um projétil o atingiu na testa. Faltavam dois.
Os disparos cessaram e eu recarreguei meus instrumentos. Depois pus em prática um velho truque: peguei o rifle que o barman tentara usar contra mim e pendurei meu chapéu no cano, então fui erguendo o chapéu devagar, na extremidade oposta de onde eu estava. Assim que ficou à mostra, meu velho chapéu virou alvo, e eu apareci no outro canto do balcão e atirei, acertando um homem na barriga.
O Silêncio reinou por alguns instantes. Eu já pensava em aprontar outra brincadeira, quando escutei passos apressados. O bandido restante havia dado o fora. Quando ouvi o barulho de um cavalo partindo a galope, saí da minha barricada. Não me preocupei em conferir se ele tinha fugido com meu mustang, pois meu amigo não permite que outra pessoa o monte.
O homem que eu havia acertado na barriga se contorcia no chão, tentado pegar o revólver que caíra próximo a ele. Engatilhei meu colt e avisei:
— Você já tem um pé na cova, mas se quiser entrar de corpo inteiro ponha a mão nessa arma.
— S-seu... seu bastardo — ele grunhiu. A voz saiu acompanhada de um ruído estranho, causado pelo sangue que saía de sua boca e o fazia engasgar.  
— Diga onde posso encontrar Miller que acabo com seu sofrimento.
— Fla... Flagstaff.
Cumpri o prometido puxando o gatilho.

Do pequeno barril sobre o balcão jorrava cerveja por um buraco de bala. Encontrei um caneco inteiro, o enchi e bebi. Tinha gosto de mijo.
No saloon restavam quatro cadáveres e o cheiro de pólvora e sangue no ar. Dei o fora dali.
Na saída do povoado, aquela singular e banguela figura continuava com seu trabalho macabro.
— Prepare quatro caixões, velho. Sabe as medidas, não?
— “Quatro”, você disse? Então não sobrou ninguém. Quem vai pagar meu serviço?
— Isso não é problema meu. Adiós.
Parti rumo à Flagstaff. Já estava mais que na hora de conhecer o famigerado Bud Miller.

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No amanhecer do terceiro dia de viajem, avistei um grupo de cinco apaches vindo em minha direção. Eles montavam em pêlo, mas traziam três cavalos selados pelas rédeas. Saquei meu winchester do estojo de sela e fui avançando devagar. Eles ficaram parados, esperando. À medida que chegava perto, notei que em um dos três cavalos selados, havia um cadáver amarrado: era o homem que havia fugido de mim no povoado fantasma.
Um dos índios cravou sua lança no chão e deu três voltas em torno dela com o cavalo. O sinal queria dizer que pretendia parlamentar. Fiz sinal positivo com a cabeça e ele veio até mim.
Para minha sorte ele era um homem maduro. Se o grupo fosse composto somente por jovens guerreiros eu estaria encrencado. Ele parou muito próximo a mim. Nossos cavalos ficaram cabeça a cabeça. Não tirei os olhos dos dele nem por um segundo, pretendendo demonstrar que não sentia medo.
Ele apontou meu cavalo e depois apontou para o próprio peito. Fiz um sinal negativo com a cabeça: ninguém pega meu mustang. Tirei um cantil com uísque da sela e entreguei a ele. O índio bebeu um gole generoso e pendurou o cantil ao redor do corpo. Me iludi pensando que se contentaria com o uísque. Ele ficou parado, esperando algo mais. Eu tinha mais de quinhentos dólares comigo, mas o dinheiro não tem valor para os índios. Peguei meu winchester pelo cano e entreguei a ele. O apache verificou o rifle e vi seus olhos se iluminarem. Era é uma bela arma, modelo 73, muito melhor que os ferros velhos que eles usavam. Havia um cacto jovem a dez metros de distância, ele atirou e o partiu em dois para delírio dos seus companheiros, que soltaram gritos de guerra para o alto. Ficou admirando o rifle com o semblante sério, acho que pensando o que decidiria. Diabo! Eu perderia o escalpo antes de entregar meu mustang.
Mas não foi preciso. Ele fez sinal positivo com a cabeça e saiu de lado para que eu passasse. Os quatro jovens atrás dele o seguiram soltando seus gritos. Perdi um bom rifle, mas conservei a pele. Não foi um mau negócio.

Alguns dias depois cheguei à Flagstaff. A cidade era grande e os vários saloons da rua principal estavam lotados. Deixei meu mustang numa estrebaria e pedi que fosse bem tratado, depois comecei a ir de saloon em saloon procurando Bud Miller. Tive sorte na quarta tentativa.
O Red River Saloon estava cheio. Era um lugar limpo e agradável, diferente das ratoeiras que eu freqüentara ultimamente. O espaço era grande e animado por várias prostitutas que faziam seu serviço nos quartos do segundo andar. Bud Miller jogava pôquer com mais dois homens.
Bebi duas ou três cervejas observando o homem até me certificar que seus cúmplices não estavam por perto. Fui até ele.
— Tem lugar pra mais um? — perguntei a Miller.
— Depende da cor dos seus dólares.
Peguei um maço de notas do bolso.
— A cor agrada?
— Puxe uma cadeira.

Depois de quatro ou cinco rodadas, percebi que Miller trapaceava. Entrei no jogo e comecei a trapacear também. Com aquela roubalheira não demorou a depenarmos os dois patos que nos acompanhavam. Acabamos ficando no mano a mano.
Eu tinha mais ou menos setecentos dólares na mesa, e Miller quase dois mil. Ele começou a embaralhar as cartas, depois distribuiu cinco para cada um.
Olhei as minhas cartas e não era um bom começo: rei e dez de espadas. As outras tinham naipes e valores diferentes. Ele conferiu seu jogo e soltou duzentos dólares sobre a mesa. Resolvi confiar na sorte e cobri. De qualquer forma aquela seria a última rodada.
— Quantas cartas? — perguntou.
— Três. — E descartei as que não serviam.
Miller não trocou nenhuma carta.
Puxei a primeira carta: dama de espadas. Puxei a segunda carta: valete de espadas. Puxei a terceira e olhei primeiro o naipe: espadas. Fiz um esforço para não sorrir. Diabo! Não era um Ás, era um nove, mas mesmo assim uma ótima mão.
Miller era um bom jogador e permaneceu impassível quando depositou mais trezentos dólares na mesa.
— Aposto tudo. — E empurrei para o meio da mesa o restante da minha grana.
Com o jogo alto, espectadores começaram a aglomerar-se em torno de nós. Miller ficou me observando enquanto coçava o enorme bigode imaginando se eu blefava. Ficou alguns instantes assim até que abriu um sorriso.
— Estou no jogo — ele disse, depositando dinheiro suficiente para pagar a aposta. — É uma pena que você esteja liso, porque com essa mão eu apostaria tudo o que tenho.
— Até sua alma?
— Que?
— Eu poderia fingir que não notei seu jogo sujo e não dizer que você é um trapaceiro filho de uma égua.
— O que voc...
— Cale a boca, eu não terminei! Eu poderia não dizer, mas vou dizer: você é um trapaceiro bastardo que joga com o dinheiro sujo dos seus crimes...
— Seu desg...
— Cale a boca! Vamos fazer o seguinte: não tenho dinheiro comigo, mas tenho um pedaço de papel com essa sua cara feia que vale cinco mil dólares, vivo — joguei o cartaz de recompensa sobre a mesa — ou morto.
Os espectadores abriram espaço e um silêncio mortal reinou no saloon. Miller levantou-se devagar, sua cadeira fazendo um ruído ao ser arrastada.  O imitei e ficamos frente a frente.
Sua mão baixou devagar até a altura da arma — uma schofield 44 — e seus dedos abriam-se e fechavam-se próximos ao cabo. Permaneci imóvel, com a mão congelada à altura do colt. Uma gota de suor projetou-se na testa do facínora e começou a percorrer lentamente sua face até parar pendurada na ponta do bigode. Fiquei atento ao seu olhar, esperando um movimento. Pisquei o olho, o que fez um lampejo de raiva inundar sua expressão. Ele estreitou as pálpebras e sacou. Fui apenas um segundo mais rápido, mas o suficiente para fazer uma bala destroçar a mão que segurava a arma. O revólver voou longe e ele soltou um urro de dor. Devolvi meu colt ao coldre e Miller aproveitou o movimento para me atacar, furioso como um urso pardo ferido. Veio pra cima de mim com as duas mãos abertas, mas agarrou o ar. Dando um passo para o lado, soquei seu estômago com a esquerda e ele se dobrou em dois. Arrematei com um cruzado de direita na lateral da face, sentindo um osso estalar com o impacto da minha mão. Com ele caído aproveitei para chutá-lo no estômago. Gostei do resultado e chutei outra vez, desta vez no rosto. Ele caiu descordado, com os braços abertos e a cara tingida de sangue.
Acendi um cigarro e conferi as cartas de Miller: quatro Ases. Patife até o fim. Peguei da mesa os quinhentos dólares com que tinha começado o jogo.
— Repartam o resto do dinheiro entre vocês dois — eu disse aos patos que havíamos depenado. — Miller estava trapaceando... e eu também.
Carreguei o homem nas costas para fora do saloon, enquanto era observado por olhares atônitos, e o levei até a estrebaria. Amarrei Miller na sela do seu próprio cavalo e me dirigi à saída da cidade puxando o animal pelas rédeas. Esporeei meu mustang pra fora da cidade. Queria estar longe dali quando os comparsas de Bud Miller dessem falta do chefe.

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Depois de mais de uma semana de estrada, cheguei ao rancho Duplo D. Minha viajem de volta poderia ter sido tranqüila, se meu prisioneiro não tivesse chamado minha mãe de todos os tipos de nomes durante a maior parte do percurso.
Dan Dagget estava esperando em frente à sua casa. Sorriu ao me enxergar e fez uma cara de nojo quando viu Miller amarrado ao cavalo. Sem dizer nada, ele entrou em casa e voltou com um laço. Miller ficou pálido ao ver Dagget preparando o nó da forca.
— Faça o que tem que fazer, e depois leve o corpo ao xerife para pegar a recompensa. Estarei esperando no hotel pelo dinheiro que me deve.
— Pode confiar. — ele afirmou.
O aspirante a defunto começou a gritar alguma coisa, mas Dagget o calou com um pontapé. Aquela história não me dizia mais respeito então parti sem demora. Quando olhei para trás, o rancheiro estava passando a corda por cima de um galho de uma velha árvore. O facínora teria o final que merecia.

Peguei a trilha de volta à cidade e já tinha me distanciado do rancho quando, de súbito, escutei uma voz gritar atrás de mim:
— Vince Logan!
Voltei-me na direção da voz e vi um jovem que mal tinha barba na cara. Trazia um velho colt dragão no coldre.
— Sou eu.
— Meu nome é Neal Stanton. Você matou meu pai e meu tio há uns dias atrás. Vim lhe apresentar a conta.
Apeei do cavalo e me aproximei. Ficamos a cinco metros um do outro.
— O inferno está cheio de gente que quis me apresentar contas desse tipo, garoto.
Ele não se intimidou e levou a mão à arma, mas a minha já estava empunhada antes que ele tocasse o cabo da dele.
— Quer tentar de novo? — perguntei, devolvendo meu colt ao coldre.
Ele engoliu em seco. Sua mão baixou novamente, mas foi ainda mais lento que antes. Foi tomado pelo medo quando deu de cara com o cano do meu revólver pela segunda vez.
— Vá pra casa, garoto. Me procure daqui alguns anos.
Ele ficou no mesmo lugar, as pernas tremendo um pouco. Resolvi incentivá-lo: arranquei seu chapéu da cabeça com um balaço. Isso fez ele se decidir.
— Eu vou voltar.
— Estarei esperando.
Fiquei observando até que ele desaparecesse do meu campo de visão atrás de uma colina. Diabo! Algum dia aquele rapaz iria me dar trabalho. Mas agora eu só pensava em alguns dias de descanso regados com muita cerveja.


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